domingo, 10 de outubro de 2010

Os malucos que encontro por aí

Estava eu no recanto aconchegante da minha cadeira-de-pc quando pensei "- ceva... geladeira" às duas da manhã.
Saí do quarto para caçar correndo o tão sonhado líquido que Deus criou de suas lamentações raivosas. imagino-o com uma barba branca criando algo para satisfazer seus desejos. Foi aí que encontrei o primeiro.
Ele estava rindo. A empatia que eu sentia me fez rir também.
"e aí? qual é que é?"
silêncio. ah, achei que ele não queria me contar.
"achei dinheiro no chão."
Seus olhos brilhantes denunciaram a verdade. Ninguém mentiria tão bem com uma expressão tão verdadeira de gringuice satisfeita. Me apavorei. Gritei, extasiada sem tomar extase, apaixonada pela ideia de encontrar dinheiro sem ter que lutar por ele.
"quanto?"
"oitenta conto!"
e foi aí que ele me contou a história dos conto que agora estou contando aqui. Andava pelas ruas na busca interior que os fumantes fazem cada vez que vão buscar cigarros no exterior. Não tinha um real no bolso, apenas o cartão do banco com saldo de três reais irreais e virtuosos.
"quanto é o cigarro avulso?"
"40 centavos"
"passa cartão?"
"só acima de cinco reais, tchê."
Na sua cabeça uma confusão de ideias pensamentos. Não tenho dinheiro. Mas e o cigarro, amigo? Você precisa fumar! O que fazer? o que fazer? putamerda, que desespero... e agora? saiu de casa na madrugada só pra comprar cigarro e não tem como passar cartão que merda! onde posso passar cartão?? será que lá na outra rua eu consigo? acho que sim, lá passa cartão.. putamerda! mas por que eu não trabalho? que desgraça que sou! que decadência! vou parar de fumar! que merda!
Aí, seus olhos miraram o chão numa tentativa de responder a todas as suas perguntas. E, milagrosamente, o dinheiro estava lá! Na frente do caixa do bar mais trash das redondezas. Estava, simplesmente, lá.
A dúvida!
Pego o dinheiro? Será? mas de quem pode ser? nossa! dinheiro no chão, tá ligado? bah, de quem pode ser? sera que pego? que foda! alguém perdeu.. sim, mas daí não vai se ligar que tá aqui... bah, e se eu não pegar vai ficar pros caras do Tropical, mas que merda! bah, vou pegar... também, eu preciso...
Saiu de lá o garoto feliz, mais feliz do que poderia estar. É como se tivesse sido abençoado com as graças de Calipso.
Comprou uma carteira de cigarros em outro bar-aberto-àquela-hora e foi embora pra tomar aquela ceva comigo e contar a história aos amigos. Rima tosca semi-pobre.
Enquanto a energia do dinheiro contagiava os corredores vazios e silenciosos de nossa casa, glamurosos lamentos artísticos de um jovem ator atormentavam as paredes ao lado. o que foi, rapaz?
e a minha simpatia mais uma vez me fazia ouvir choros de algum conhecido desconhecido. Fodido, o rapaz nos contou (a mim e ao sortudo amigo) que passava pela crise existencial mais foda de sua vida. ele foi o segundo.
e eu tentava puxar papo enquanto a felicidade sumia do rosto do amigo do dinheiro pra quebrar o clime de tensão e morte. Ninguém havia morrido, é claro. Ou sim. Depende do ponto de vista.
E esse conhecido me contou de sua dor interior e seu temor em relação aos outros e ao mundo inserido dentro e fora de seu ser. Despercebido, o primeiro ficou de canto no seu canto de escritório da antiga delegacia onde ele era o xerife nos tempos solitários luminosos.
E bêbado de vinho, Dionísio apareceu no quarto. Teatro, vinho e amor. Os gregos eram foda mesmo.
"eu gosto muito de ti, Sabrina"
"obrigada, eu também gosto de ti, amigow"
Elogios são sempre amorosos quando proferidos por aqueles a quem Dionísio abençoa. E à toa, fiquei ouvindo o cara falar de sua vida e eu pensando na amiga que tinha ido dormir e se ela estava bem.
Por fim, apareceu o terceiro maluco, cuja estória é mais pequena mas só porque falei três minutos só com ele.
Aí, mandei todos irem dormir como se eu tivesse algum poder pra isso. Enfim, durmam, queridos foi o que pensei. E eu vim pra cá pra escrever e me perdi nos pensamentos.
Boa noite.

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Se eu pudesse fazer um plus e já fazendo eu falaria do último que encontrei quando fui escovar os dentes depois de já ter postado o post. Na verdade não foi nada de mais, era só um comentário.
Já não sei quem é maluco ou não. Pra mim, todos parecem ser agora.
O que faz alguém acordar só pra escovar os dentes na madrugada e depois voltar a dormir?
A Literatura compreende o real e o irreal. Os doidos e os normais, se é que eles existem.

Um comentário:

  1. O garoto, esse ai da grana, deveria ter se virado pro caixa (um daqueles que sempre erram no trocos)
    e ter dito:

    Nao aceita cartao? Entao pega isso aqui e me dá 20 carteiras de Marlboro light, maço por favor!

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